O Brasil na encruzilhada: apontamentos para uma reforma do Estado de natureza republicana, democrática e desenvolvimentista
Resumo
Na atual quadra de desenvolvimento nacional, o Brasil encontra-se diante de escolhas irreconciliáveis. Ou se submete aos processos de moralização arcaica dos costumes, valores antidemocráticos e criminalização da política e dos movimentos sociais, ou se levanta e luta. Ou adota o caminho da mediocridade e da subalternidade (econômica, política e social; mas também intelectual, moral e cultural), ou se reinventa como nação para escrever o seu próprio destino histórico.
Para irmos ao ponto, sem tergiversar, essa é a encruzilhada civilizatória na qual se encontra o país neste fatídico ano de 2016. Nestes termos, cabe buscar uma interpretação — ainda que geral — acerca dos determinantes principais da situação atual, bem como aventar condições e caminhos para algum tipo de superação positiva frente ao impasse nacional desse período histórico.
Resumidamente, por razões cujas explicações completas extrapolam o escopo deste texto, a conjuntura brasileira (política e econômica) deteriorou-se em 2015, colocando dúvidas sobre a continuidade do processo de desenvolvimento em curso desde 2003, no qual três vetores impulsionaram a dinâmica econômica, a saber: i) o alargamento do mercado consumidor doméstico; ii) os investimentos em infraestrutura econômica, social e urbana, capitaneados pelo PAC (Programa de Aceleração do Crescimento) desde 2007; e iii) a expansão dos investimentos e exportações no amplo segmento dos recursos naturais (agropecuária e extração mineral), em particular commodities.
Muito brevemente, referimo-nos a um conjunto de fatores como:
• A persistência da crise econômica internacional que se arrasta desde 2008.
• A queda dos preços internacionais do petróleo, situação que se vê agravada, no caso brasileiro, por denúncias de corrupção envolvendo contratos superfaturados da Petrobras, a principal empresa estatal nacional a compor o arranjo até aqui exitoso de recuperação de investimentos em infraestrutura no país.
• A sobreposição de crise hídrica e crise energética, afetando justamente a região Sudeste – vale dizer, a mais industrializada e populosa – do Brasil.
• Uma crise política decorrente do acirramento ideológico havido nas últimas eleições presidenciais brasileiras em 2014, e que se desdobra, desde então, em fortes tensões e descrédito intra e entre os poderes Executivo, Legislativo e Judiciário, todos envolvidos em casos de corrupção ativa ou passiva.
• Por fim, mas não menos importante, e sem pretender estender demasiadamente a lista, uma profunda crise de legitimidade e desconfiança sobre os principais meios de comunicação privados do país (televisões, rádios, jornais e revistas, impressos e eletrônicos), os quais assumiram posicionamentos político-ideológicos e atitudes abertamente oposicionistas ao governo, em particular ao Partido dos Trabalhadores (PT), por meio das quais conseguiram deflagrar o golpe de Estado de 2016 no país.
Tudo somado, trata-se, portanto, de ambiente bastante acirrado de contradições que vem jogando para baixo tanto o nível pretérito de confiança engendrado pelos três motores de expansão acima indicados, como as expectativas futuras da classe empresarial (nacional e estrangeira) em relação às perspectivas de novos negócios e sustentação do crescimento econômico. Assim, podemos resumir a situação dizendo que a convenção de crescimento, que ancorou a trajetória relativamente exitosa da economia brasileira entre 2003 e 2013, pode ter se esgotado ou estar aguardando o desfecho dos acontecimentos narrados acima (IPEA, 2010).3
De todo modo, nada do que venha a ocorrer invalida os argumentos apresentados neste trabalho com relação ao momento situacional da vida nacional e à encruzilhada civilizatória brasileira mencionada acima. Daí a necessidade de se perscrutar os determinantes gerais da situação presente (seção 1), bem como vislumbrar condições e caminhos para a superação positiva do impasse atual (seção 2).
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